(…) o vídeo, mostrando uma série de negativos, reforça a ideia de perda de referencialidade das imagens. Mas devemos reparar que este vídeo tem som, e esse som evoca uma máquina de projecção (sublinhando assim, o aspecto técnico e maquínico) e é interrompido no final por um breve discurso que parece radiofónico ou dos antigos locutores da televisão, onde é pronunciada uma frase de tom poético. Nessa frase surge a expressão que dá o título à exposição: “Horizontes Brancos”. O que faz este registo áudio e esta “banda sonora” da projecção? Trazem para o primeiro plano as máquinas de visão e de audição, integram os dispositivos técnicos como elementos fundamentais (…)
António Guerreiro
(…) A narrativa — a história de uma vida ou a história de uma comunidade — é a (re)construção e a (re)organização constante das recordações pelas quais se estabelece a memória. A construção contínua e actualização de uma narrativa implica uma participação imaginativa, ou seja, uma participação ficcional que se revela no processamento da sucessão de eventos que é, como anteriormente mencionado, filtrada pelo esquecimento (e desconhecimento), na dependência que a lembrança tem da informação, da comunicação ou de um diálogo que, mais não seja, do sujeito consigo próprio. Percebe-se assim que a eleição do que se escolhe lembrar defina o tom da verdade de cada um , o tom de toda a verdade sobre o homem apresentada. É este agenciamento da temporalidade e da lembrança que nos é proposto em Horizontes Brancos; recorrendo ao seu espólio privado, o artista apresenta-nos uma nova seleção e sucessão de imagens em negativos — de evidências do desenrolamento e vida de uma linhagem — convidado ao pensamento e ao diálogo, ao testemunho e à participação numa nova história que trespasse a memória.
Andreia César